quinta-feira, 12 de agosto de 2010

A Deusa dos Orixás




Numa reunião apressada, feita com urgência, as divindades debatiam os rumos dos mortais. A terra era assolada pela segunda guerra mundial. Morte e destruição tomavam conta do planeta e os humanos perdiam completamente a sua fé. Como ela poderia resistir diante de tanta atrocidade?
Várias sugestões foram dadas, buscando trazer algum alento aos homens, uma forma de fazer com que eles voltassem a ter esperança, a acreditar que as coisas poderiam melhorar e, principalmente, que eles não estavam sozinhos. Precisavam saber que "alguém lá em cima" olhava por eles.
Iansã então disse que precisavam mandar um representante, alguém que pudesse mostrar aos mortais que eles, os deuses, ainda estavam vivos e que zelavam pelos homens. Mas quem seria esse mensageiro? Qual Orixá desceria à terra para cumprir tal missão? Diante da recusa de todos, Iansã, a mais guerreira das divindades, disse que se sacrificaria, gerando um filho para esse propósito. Ogum, apaixonado pela senhora dos ventos e das tempestades, se prontificou a ser o pai da criança.
No dia 12 de Agosto de 1942, a criança divina chegou à terra. Clara Francisca Gonçalves Pinheiro trazia as características dos pais. Corajosa, impetuosa, irreverente e inquieta, Clara decidiu que a única forma de fazer com que os humanos reconhecessem o toque dos Deuses, seria através da beleza. Então ela abriu a boca e a beleza brotou.
A lenda diz que durante anos, a filha dos Deuses espalhou a semente da esperança. A voz que atingia os corações, que trazia o tão procurado alento para as dificuldades da vida. A presença marcante, iluminada que só mesmo uma divindade poderia ter. Clara era luz!
Mas os Deuses, tão cheios de características humanas, pela primeira vez tiveram inveja dos mortais. Os homens tinham algo que os Orixás não possuíam. Os homens tinham Clara.
Ficou então decidido que a missão de Clara Nunes na terra já havia acabado. Sua missão estava cumprida. Clara disse que não, tentou negociar, argumentou que as guerras ainda existiam, que muitas pessoas ainda eram descrentes e que ainda tinha muito o que fazer, mas de nada adiantou.
Em 2 de Abril de 1983, os Orixás levaram Clara para junto deles. A partir de agora, só os Deuses desfrutariam do privilégio de ver e ouvir Clara Nunes. Na terra, ficou o vazio. Apenas a lembrança de um iluminado sorriso que realmente parecia tornar o mundo melhor.
Mas os Deuses, condoídos com o sofrimento dos mortais, tomaram uma decisão e resolveram permitir que, apenas aqueles que tivessem fé, continuassem ouvindo a voz de Clara.
Se você acredita, é fácil. Ouça o vento passando pelas árvores, a onda batendo na praia, os trovões cortando o céu. Ouça com a alma e ao longe você vai escutar a divinal voz de Clara entoando "Galo cantou às quatro da manhã. Céu azulou na linha do mar. Vou-me embora desse mundo de ilusão, quem me vê sorrir, não há de me ver chorar."
Salve Clara! Eparrei!


4 comentários:

  1. Emocionante a sensibilidade com a qual você tratou Clara Nunes, uma representante de nossa música que merece os maiores de nossos aplausos. Tanto pela beleza estonteante, de "morena com chocalho amarrado na canela", quanto pelo indescritível talento. Enfim, alguém que não teve tempo de mostrar tudo que podia. Mas que deixa, ainda assim, enormes saudades.

    Parabéns, garoto!

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  2. Nossa rapaz...que beleza de post.
    Quisera o EnTHulho ter um post desse...rs
    Ao menos dá pra ter uma ideia da riqueza de texto que vc irá me enviar pr'eu publicar lá :D
    Falando da protagonista da postagem, Clara sempre foi uma diva "simples'. De simplicidade tão especial que, como dizes, os deuses tinham mesmo inveja cristalina dela.
    Feliz palavras, bela homenagem
    Parabéns!

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  3. Maravilhoso! Fábio e TH já disseram tudo o que eu ia dizer, mas... Ainda cabe aqui um elogio a forma como você nos apresentou Clara. Absolutamente perfeito. Lindo e emocionante...

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  4. A Clara foi única! Eu adorava a músicas dela!

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