O primeiro livro de poemas que tive na vida – e, sinceramente, não tive muitos – foi herdado da minha avó materna. Era um livro bonitinho, de capa dura e, se não me falha a memória, a capa era de uma cor que muito lembrava a embalagem do desodorante Alma de Flores.
Ou seria melhor dizer Alma de Flôres?
No livro que herdei de vovó, o que mais se via era um festival de acentos circunflexos: flôres, amôres, côres, dôres... Estranhamento geral; afinal de contas, outros livros que eu já tinha lido antes – e que pareciam ser tão antigos como meu novíssimo livro de poemas old school – não tinham tal peculiaridade ortográfica que me parecia altamente desnecessária. Para mim e para o resto do mundo, visto que deram um jeito de parar com essa colocação desenfreada de “chapeuzinhos” nas palavras. Mais fácil para todo mundo.
Passou o tempo, muitas páginas foram escritas e eis que, num belo dia, a comunidade falante da Língua Portuguesa foi sacudida por uma outra reforma. Ou por uma ideia de... Que seja.
A ideia era unificar a grafia da nossa querida última flor do Lácio, eliminando os c de facto, exacto, tacto, cacto... Opa, cacto não, disfarça. E eliminar, além das letras desnecessárias, sinais gráficos desnecessários. Portanto, lá se vão os excessos de acentos agudos em palavras como ideia, colmeia e similares. O pessoal parece que não se importou muito com a derrubada dos <<´>>, mas foram mexer com o trema e aí...
Parece que um monte de gente, que aparentemente não ligava muito para os dois pontinhos que ficavam em cima de lingüiça, lingüística ou seqüestro, tomou-se de dores pelo sinal e resolveu protestar colocando-o até onde originalmente não devia estar. Afinal de contas, pobre trema, não fez nada. E era por não fazer nada que estava sendo limado da ortografia.
Escrever linguística assim, sem o <¨>, é difícil mas a gente acaba se acostumando. O problema mesmo é decorar as novas regras do hífen, que o povo deve estar maldizendo até hoje. Ante-sala ou antessala? Auto-retrato ou autorretrato? Extra-seco ou extrasseco? Inter-racial ou interracial? [o negritado é a forma correta, só pra constar]. Haja cabeça para organizar tudo isso até 2012!
Quer dizer, até 2012 para uma parte do povo, porque editor, tradutor, revisor e concurseiro já tá fritando a matéria cinzenta desde que saiu esse bendito novo acordo.
Se isso vai ser bom mais pra frente? Vamos perguntar daqui a um tempo às crianças que vão ser alfabetizadas com essas novas regras. Um dia alguém há de pegar um livro publicado há uns cinco anos, olhar uma palavra grafada com trema e fazer a mesma cara de “hein?” que eu fiz para o livro de poemas que herdei de vovó. Ou não.
Em tempo: para saber mais sobre o acordo, confira o http://www.reformaortografica.net/ ;)
Eu estava lendo sobre essas novas regras esses dias. O trema e algumas palavras corriqueiras, como ideia, são mais fáceis de assimilar. Já o hífen, como bem ressaltado no post, vai ser complicado. Na verdade, descobri que ele já era complicado!
ResponderExcluirDescobri (e fiquei chocado) que pera, a fruta mesmo, não tem mais acento.
Fico no desespero toda vez que vou escrever alguma coisa. Acho que as mudanças deveriam ficar apenas no trema haha
ResponderExcluirConfesso que, com relação à reforma ortográfica, eu me rebelei lindamente. Continuo acentuando ''idéia'' e acho que vou acentuar pra sempre - exceto que seja obrigado a não fazer isso, no caso, de um concurso público, por exemplo - mas é que eu sou chato, crio um vínculo com a grafia das palavras, fica difícil desapegar. Agora, o trema eu bani com facilidade.
ResponderExcluirConfesso que sou #TeamTrema e sinto falta, sabe.
ResponderExcluirComo a professorinha vai explicar a pronúncia de LINGUÍSTICA sem o trema? A criança vai querer falar como se escreve - como eu fazia com MUITO (todo mundo fala MUINTO, né?), até que ela ~~gentilmente~~ me catequizou e eu aderi. Mas ó, nunca aceitei direito isso, hein.
Enfim.
Apesar disso, não quero ficar obseleto e ser como minha avó que escreve SÒMENTE com o acento grave de mil-novecentos-e-peitinhos-de-per-amore. Né mesmo? FAZEROQUÊ.
Se bem que o trema não fazia mal a ninguém... =P
LEAVE TREMA ALONE.