segunda-feira, 11 de abril de 2011

Sopa de letrinhas e sinais

Ou um texto sobre reforma ortográfica.

O primeiro livro de poemas que tive na vida – e, sinceramente, não tive muitos – foi herdado da minha avó materna. Era um livro bonitinho, de capa dura e, se não me falha a memória, a capa era de uma cor que muito lembrava a embalagem do desodorante Alma de Flores.

Ou seria melhor dizer Alma de Flôres?

No livro que herdei de vovó, o que mais se via era um festival de acentos circunflexos: flôres, amôres, côres, dôres... Estranhamento geral; afinal de contas, outros livros que eu já tinha lido antes – e que pareciam ser tão antigos como meu novíssimo livro de poemas old school – não tinham tal peculiaridade ortográfica que me parecia altamente desnecessária. Para mim e para o resto do mundo, visto que deram um jeito de parar com essa colocação desenfreada de “chapeuzinhos” nas palavras. Mais fácil para todo mundo.

Passou o tempo, muitas páginas foram escritas e eis que, num belo dia, a comunidade falante da Língua Portuguesa foi sacudida por uma outra reforma. Ou por uma ideia de... Que seja.

A ideia era unificar a grafia da nossa querida última flor do Lácio, eliminando os c de facto, exacto, tacto, cacto... Opa, cacto não, disfarça. E eliminar, além das letras desnecessárias, sinais gráficos desnecessários. Portanto, lá se vão os excessos de acentos agudos em palavras como ideia, colmeia e similares. O pessoal parece que não se importou muito com a derrubada dos <<´>>, mas foram mexer com o trema e aí...


Parece que um monte de gente, que aparentemente não ligava muito para os dois pontinhos que ficavam em cima de lingüiça, lingüística ou seqüestro, tomou-se de dores pelo sinal e resolveu protestar colocando-o até onde originalmente não devia estar. Afinal de contas, pobre trema, não fez nada. E era por não fazer nada que estava sendo limado da ortografia.

Escrever linguística assim, sem o <¨>, é difícil mas a gente acaba se acostumando. O problema mesmo é decorar as novas regras do hífen, que o povo deve estar maldizendo até hoje. Ante-sala ou antessala? Auto-retrato ou autorretrato? Extra-seco ou extrasseco? Inter-racial ou interracial? [o negritado é a forma correta, só pra constar]. Haja cabeça para organizar tudo isso até 2012!

Quer dizer, até 2012 para uma parte do povo, porque editor, tradutor, revisor e concurseiro já tá fritando a matéria cinzenta desde que saiu esse bendito novo acordo.

Se isso vai ser bom mais pra frente? Vamos perguntar daqui a um tempo às crianças que vão ser alfabetizadas com essas novas regras. Um dia alguém há de pegar um livro publicado há uns cinco anos, olhar uma palavra grafada com trema e fazer a mesma cara de “hein?” que eu fiz para o livro de poemas que herdei de vovó. Ou não.

Em tempo: para saber mais sobre o acordo, confira o http://www.reformaortografica.net/ ;)

4 comentários:

  1. Eu estava lendo sobre essas novas regras esses dias. O trema e algumas palavras corriqueiras, como ideia, são mais fáceis de assimilar. Já o hífen, como bem ressaltado no post, vai ser complicado. Na verdade, descobri que ele já era complicado!

    Descobri (e fiquei chocado) que pera, a fruta mesmo, não tem mais acento.

    ResponderExcluir
  2. Fico no desespero toda vez que vou escrever alguma coisa. Acho que as mudanças deveriam ficar apenas no trema haha

    ResponderExcluir
  3. Confesso que, com relação à reforma ortográfica, eu me rebelei lindamente. Continuo acentuando ''idéia'' e acho que vou acentuar pra sempre - exceto que seja obrigado a não fazer isso, no caso, de um concurso público, por exemplo - mas é que eu sou chato, crio um vínculo com a grafia das palavras, fica difícil desapegar. Agora, o trema eu bani com facilidade.

    ResponderExcluir
  4. Confesso que sou #TeamTrema e sinto falta, sabe.

    Como a professorinha vai explicar a pronúncia de LINGUÍSTICA sem o trema? A criança vai querer falar como se escreve - como eu fazia com MUITO (todo mundo fala MUINTO, né?), até que ela ~~gentilmente~~ me catequizou e eu aderi. Mas ó, nunca aceitei direito isso, hein.

    Enfim.
    Apesar disso, não quero ficar obseleto e ser como minha avó que escreve SÒMENTE com o acento grave de mil-novecentos-e-peitinhos-de-per-amore. Né mesmo? FAZEROQUÊ.

    Se bem que o trema não fazia mal a ninguém... =P
    LEAVE TREMA ALONE.

    ResponderExcluir